segunda-feira, setembro 15, 2003

O dia corria como um outro qualquer dia de frustração, igual a tantos outros. Tudo tinha sido iniciado nos tempos remotos, quando era um jovem adolescente de 14 anos, e decidiu pegar nos livros do pai, não para os mudar de sítio, mas para os devorar com a leitura e tentar perceber a estranha linguagem que ele falava, o pai. Aquela estranha linguagem que ele fazia pairar pela casa fora, desde os tempos em que o tempo é tempo, desde os tempos que ele se recorda como tal. Assemelhava-se a um grande monologo, sempre em construção... um grande poema em construção, talvez.
Aquele dia parecia estar destinado a algo diferente, dessa frustração, apesar de ter sido atravessado, como sempre, pela re-descoberta da mesquinhez nos seus colegas e pares, nos Zés Ninguéns que eram e seriam sempre na sua vida e tentariam tornar a vida dos outros iguais às dos outros, sem sentido ou significado, como a de todos, mas convictos de que isso era um fim em si mesmo, a ser levado sem orgulho ou honra e que ninguém poderia lutar contra isso e só a tentativa de tentar era uma afronta.
Algo crescia e teimava a não dar a cara…
Os minutos iam passando e nada, tudo igual ao de sempre, as ruas continuavam no mesmo sitio, os carros passavam por cima delas, o fardo das pessoas ia com eles, alguns descansavam nas esplanadas que existiam nesses últimos dias de Verão, outros tinham desistido e ficado por casa a ver televisão ou a ver se a noite vinha mais depressa através de outras janelas na Internet.
Um sinal de vida, mais que um sinal de vida transportava o toque do telemóvel, era o presságio que estava para vir, inesperado dentro dos dias visionados através da frustração destorcida da realidade e na monotonia de alguma coisa poder aparecer, mas não existir...
“Não vais acreditar, o pior que pensavas..”
“O quê?”
“O pior que tinhas imaginado, do que tinhas escrito, vai acontecer”
“Mas o quê? Estás a falar de que?”
“Aquele sobre o café, de estarem todos juntos, no futuro…”
“Sim, mas não estou a perceber?”
“Vou ter um filho…a minha namorada telefonou-me e disse que está gravida..”
“A sério? Não é possível. Quanto tempo?”
“Já desconfiávamos… no Verão… estás a ver… aconteceu. Ela hoje fez o teste de gravidez e deu positivo. Vou ter um filho!”
“Que cena, não estava à espera desta noticia. E como estás?”
“Altamente, é mesmo altamente. Daqui a um ano, casado, um filho, a trabalhar…”
“Onde estás? Vou aí ter…..”
Algo finalmente tinha acontecido, o que tinha tornado aquele dia diferente, mas ainda não tinha dado a cara. Veio através de um telefone, mas capturou toda a atenção, fez bater o coração e viajar em alucinações de outras vidas.
Ele não sabia, mas era apenas o início do seu primeiro filme que iria vivênciar nesse dia, começado por volta das oito manhã, entendido como apenas mais um, até o telemóvel ter tocado, às seis da tarde.
Nunca mais parou de rodar em volta de filmes que ainda sustêm na memória e o invade de tempos a tempos, quando os dias se tornam a algo semelhante a uma frustração, desde o dia que decidiu abrir o primeiro livro que lhe veio à mão e começou a ler…

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