O vovô preparava-se para mais uma saída, a vovó ajudava-o a vestir a roupa, a alinhar os poucos cabelos que possui no seu crânio, orgulhosos de ainda persistirem ao tempo. Não sabia o que ele fazia, para onde ia, se a vovó sabia o que ele fazia, era demasiado pequeno para perceber o mundo dos adultos e as suas necessidades.
Não era a primeira vez que observava esta cerimónia, repleta de movimentos de inquietação, de ambos os participantes, assemelhava-se a uma luta, onde a vovó, pela sua imposição física, dominava a relação.
Aquele dia seria diferente para mim, ouviria a conversa dos dois e percebia que o mundo dos adultos não era o meu.
“Alberto, abotoa a tua camisa e penteia-me esse cabelo, é assim que queres que a tua amante te veja?”
“Que amante? Cala a boca mulher, está ali o João a ouvir, ele não tem que ouvir estas coisas do seu avô!”
“Alberto és tão ingénuo, achas que ele já não sabe? Apesar de só ter 12 anos, já sabe muita coisa.”
“Cala a boca, Raios! Mas mesmo assim importo-me que saibam dos meus affairs. Tenho que ser discreto, para o bem da família.”
“Sim, sim. Ninguém nota nada, as tuas noitadas, desde que te conheço, o dinheiro que esbanjas com as tuas amantes, os jantares que lhes pagas nos restaurantes mais caros da cidade, onde os nossos amigos também vão jantar. Por amor de Deus, se quisesses ser discreto tinhas que recuar uns cinquenta anos atrás e mudar o teu estilo de vida, a alma e o corpo.”
“Porra mulher, de vez em quando não percebo porque casei contigo. Vês a vida de uma forma tão simples que me aflige como podes tu teres cinquenta anos e uma cabeça de quinze.”
“Casei contigo e foi a melhor coisa que fiz na minha vida. Saí da pobreza, tenho uma vida feliz, faço o que quero, formei uma família, todos têm pão nas suas casas e um tecto para os abrigar e sou feliz assim. Tenho muito que te agradecer por isso. Se te queres divertir com as tuas meninas, estás há vontade, não vou ser eu demover-te das tuas intenções, acho que ganhaste por direito às tuas incursões, desde que todos os dias voltes a casa, cumpras com as tuas obrigações cá em casa e sustentes a família como sempre o fizeste, por mim está tudo perfeito e na ordem em que deviam estar.”
“OK mulher, aceito o que dizes, não só para te fazer calar, por estar já atrasado e porque te amo, à minha maneira e continuarei a fazê-lo e por ter sido a única razão porque casei contigo e nunca te deixei.”
“Sim, sim, vai te embora, quero ver-me livre de ti, tenho mais que fazer” (beijo na fronte do meu avô). O vovô sorriu, passou a mão na mão da vovó, virou-se para mim e perguntou:
“Queres vir hoje comigo?”
“Posso vovó?”
“Claro que podes ir com o teu avô!”
“Não te importas que eu vá e te deixe sozinha?”
“Claro que não. Tenho aqui as minhas empregadas, umas amigas minhas vão aparecer cá para o chá e os teus primos não tardam nada e estão aí a destruir tudo. Vai e porta-te bem.”.
Aproximou-se de mim, abraçou-me e sussurrou no meu ouvido “vê lá se não aprendes com os maus hábitos do teu avô e depois conta-me tudo.” (beijo).
O meu avô pegou-me pela mão e transportou-me pela casa for a. O motorista abriu a porta do carro e pela janela vi a minha vovó a dizer adeus e a sua figura a ficar cada vez mais pequena à medida que o carro galgava o alcatrão da estrada que me conduzia para uma das amantes do vovô.
domingo, novembro 09, 2003
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