Mais uma vez tinha-o retirado inutilmente do bolso. Nada.
“Merda!” dizia ela.
D. Xica podia ser considerada uma pessoa nervosa, doente da cabeça e até uma neurótica obsessiva-compulsiva se não a conhecessem.
Brandia aos céus sempre que o acto que tinha realizada se tornava igualmente inútil, pois deparava-se com a inutilidade de um objecto que trazia no bolso, agora compulsivamente.
Encontrava-se por terras fracamente habitadas, onde a mão humana mal se notava, apenas alguns laivos de desenvolvimento fornecidos por postes de electricidade visionados na vasta paisagem verde, que na realidade não traziam nada por terem sido cortados numa avalanche há três anos atrás, mas mesmo assim procurava avidamente sinais de civilização através do objecto que trazia no bolso, demonstráveis pela aparição de pauzinhos de rede.
Há cerca de dois dias que esse maldito objecto viciante, de nome telemóvel, não captava nenhum pau de rede, não podendo receber ou enviar mensagens.
Isso chateava-a muito, não só o facto de não ter rede e dar uma utilidade nula aquele objecto que trazia no bolso, mas principalmente por se ter tornado completamente dependente, não conseguindo abstrair-se dele por uns míseros três dias e apreciar as férias de sonho que estava a realizar.
Mais uma vez levou a mão compulsiva ao obsessivo bolso, onde nada haveria de encontrar e uma vez mais gritar a palavra merda, maldizia do telemóvel antiquado que tinha resolvido trazer consigo.
Juntamente com ele viajava um amigo, algo chato mas o único que tinha aceite o desafio, que constantemente lhe pedia o telemóvel para enviar mensagens, pois tinha resolvido não o trazer.
“Assim estarei mais perto das pessoas e da realidade”, dizia ele para ela, o que a aborrecia muito, mas nada dizia, poderia ele ficar magoado e deixa-la sozinha naquele fim de mundo sem um pauzinho de civilização.
Pela terceira vez em menos de um minuto olhou para o ecrã sem rede que apenas indicava as horas do sítio onde se encontrava, 8:36 “em Portugal devem ser uma 13h36. Ele deve estar em casa a almoçar” pensava ela.
Desligou o telemóvel farta da sua inutilidade, com a certeza de que o ponho agora no saco e de lá só o tiraria dentro de três dias.
“Acabei de enviar uma mensagem!” disse uma pessoa ao seu lado.
“A sério?”, sorria D. Xica, já com o telemóvel na mão e com o dedo sobre o botão que ligava o dito.
sexta-feira, janeiro 09, 2004
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