domingo, janeiro 11, 2004

Mais uma cerveja

“Mais uma cerveja seria bom.” dizia ele com os seus olhos a brilhar.
“Não sejas parvo. Daqui a nada vais ao gregório e eu é que tenho de te aturar. Se ao menos hoje dormisses na casa dos teus pais. É assim que me tratas. Quando dizes que passas a noite comigo, esqueces-te de referir que apenas lá vais para ressacar.” disse ela zangada e com grande vontade de o esbofetear, mesmo sabendo que isso lhe seria indiferente.
Quis sair dali, mudar de face, mudar de namorado, de terra, de país, de emprego, de tudo. A vida que tinha escolhido para si não era aquela que queria, apenas a que lhe tinha sido possível, na verdade nunca realmente teve hipóteses de escolher. Das poucas coisas que tinha escolhido, apesar de não ser muito correcto chamar escolha à paixão, saiu-lhe um bastardo insensível, com gosto para a bebida e a delinquência.
“Até parece! Eu gosto muito de ti mas sabes bem que os meus pais não gostam que eu beba e esta é das poucas oportunidades que tenho para me divertir.” disse ele com o maior sorriso do mundo, aquele que a seduziu em cinco segundos, ao mesmo tempo que metia a sua mão sobre um dos seus sítios predilectos.
“Estás a dizer que não te divertes comigo sóbrio?” disse ela, tentando fazer um ar sério, pois realmente não acreditava no que dizia. Um namoro sem zangas não tem piada nenhuma e para mais era muito aborrecido. Seguramente terminaria essa relação mais cedo do que em uma onde houvesse constantes brigas, isso apenas fortalecia a relação. Essa era a convicção dela.
“Bebe um copo comigo. Porque nunca bebes um copo comigo?”
“Não desvies a conversa!” desfazendo-se num sorriso que estragava por completo a intenção da sua frase. “o bastardo sabe bem como me dar a volta. Se ele não fosse tão bom na cama e não me mimasse tanto com presentes, já lhe teria dado com os pés.” pensou ela. Entretanto já ele lhe assaltava o pescoço com um beijo, provocando-lhe um arrepio transformado em pele de galinha e furtivamente aproximava as suas mãos aos seus seios oponentes.
“Sabes que não gosto de beber, nem de te ver bêbado. Começas logo a mirar outras e eu fico cheio de ciúmes. E já sabes como eu sou quando fico com ciúmes.”
“Mais sexy!”
“Pára de me bajular, não me consegues dar a volta com essas tuas falinhas mansas.”
“Só há três anos para cá. Desde o dia que te fisguei na praça e nunca mais consegui desgrudar de ti.” dizia ele com um sorriso de triunfo e gozo.
“Pois! Senão fosse eu, era a minha amiga. A minha melhor amiga, eu bem me lembro.”
“Isso era apenas para ficar mais perto de ti. Se lhe desse um beijo pensaria sempre em ti. Vem cá e dá-me um, há já muito que não sinto os teus lábios.”
“OK, só um, não bebes mais e vamos já para casa.”
“OK!” disse ele a mentir com todos os seus dentes.
Ele deu o beijo, pediu mais uma cerveja e voltou, literalmente, nos braços dela, quase a desfalecer sob o seu peso. Despiu-o e ainda demorou a adormecer, não só por causa dos roncos etílicos dele, mas também a pensar no que tinha falhado durante a sua curta vida, que apesar de não gostar dela, lhe tinha tanto apego. Virou-se para ele, olhou bem para as suas grandes costas musculadas, passou a mão pelas suas vértebras, provocando um leve calafrio nele, rapidamente esquecido como um sonho, continuando a sua sinfonia roncónica.
Ela agarrou-se a ele como se ele fosse a pedra que a ancorava a este seu mundo.

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